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Quem passa na Calçada da Estrela nem desconfia. O estúdio é uma
caverna – é uma clareira.  Começa cedo, às primeiras pinceladas sente-se onde
vai dar a pintura. Todavia é uma surpresa o fim – e falta tanto para o fim:
só acaba quando nunca acaba. Assim como uma bandeira nunca acaba. É sempre
um “vamos ver”. Ir até à cor concretamente, que é ir de olhos, de corpo, ir com
tudo, até pra lá da cor. Física. Ir indo. (Pintura é ir indo).

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Na pintura do Pedro, como na canção do Caetano, ‘a terra inspira e exala os seus
azuis’ – e é mesmo isso: terra, sombra queimada, vermelha, de Siena, de Marra-
quexe, do sul. Terra azul. Branca. Gris. Daqui.
Azul-rei. Azul mediterrâneo – mas por ser uma pintura oblíqua ao Mediterrâneo
o mar é ocre, é cor de pele ao sol, é cor dos muros levantados de chão. Mar
vertical. Cor de terra natural. Cor de terra tecnológica. Que isto é pintura: viva
feito um mar vivo. O mar – um deserto! (Para chegar à beira do que disse
Marina Tsvietaiéva ao escrever sobre a pintora russa Natália Gontcharova:
‘o deserto – um oásis!’). Talvez por essa via mediterrânica-oblíqua, este seja
um pintor português. Como se isso lhe interessasse! Estrangeiro no seu
próprio estúdio.

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‘Deslizo,
oculto aqui,
vigiando o oco do tempo.
Espaço ermo, parado.
Nada acontece. Nada parece acontecer.
Mas algo flui, o irremediável,
queimando todas as pontes de regresso.’

(Waly Salomão)

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No sábado, 21 de março, Pedro Chorão inaugurou não uma, mas duas
exposições: uma no Fundão, na “Moagem”, a outra em Castelo Branco,
na “102-100”, e como se isso fosse pouco, lançou um livro (Pintura
1971-2009).
Pedro Chorão é uma espécie de Morandi que viajou. Ou um Jasper Johns para
outras bandeiras. É um Henrique Pousão Índico. É um Julius Bissier de manhã
cedo, Atlântico.

Pintura é não voltar mais. É vigiar. Através.
Tô no ir.